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MEDIDAS COERCITIVAS DO ARTIGO 139, IV, DO CPC EM CONFRONTO COM A DIGNIDADE DA PESSOA


Recentemente, no dia 09 de fevereiro de 2023, o Supremo Tribunal Federal julgou Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5941, declarando constituc

ional o dispositivo do Código de Processo Civil (art. 139, IV)[1], que permite ao juiz determinar medidas coercitivas para liquidação de dívidas judiciais, como a apreensão da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) e de passaporte, a suspensão do direito de dirigir e a proibição de participação em concurso e licitação pública.

As matérias destacadas no julgamento da ADI são: o direito constitucional de ir e vir e, a dignidade da pessoa humana (arts. 1º, inciso III e, 5º , incisos XV e LIV, da CF), com relação da apreensão da CNH e passaporte.

Com relação a vedação de participação em concursos públicos ou licitações públicas, são destacados os artigos 5º, inciso II; 37, incisos I e XXI; 173, § 3º e 175, da Constituição Federal.

O voto do Relator Ministro Luiz Fux, foi acompanhado pela maioria do plenário que decidiu pela improcedência do pedido. Em resumo, a maioria dos ministros entenderam que o texto genérico do inciso IV do artigo 139, do CPC, dá condições ao magistrado em ter entendimento amplo para por fim aos litígios de forma célere e eficaz.

Dessa forma, cabe a cada magistrado analisar caso a caso e na medida da proporcionalidade e razoabilidade aplicar tais medidas coercitivas, resguardando a dignidade da pessoa humana.

Acontece que na prática não é isso que teremos. Ao meu ver, a interpretação dada ao artigo 139, inciso IV, do CPC é equivocada e fere sim a dignidade da pessoa humana do devedor.

Como um magistrado poderia cassar uma habilitação ou passaporte? Qual a efetividade dessa medida? Então, caso o devedor ganhe de um familiar ou amigo uma viagem, não pode viajar porque tem o passaporte apreendido? Não pode andar de veículo emprestado?

E o pior, não poder participar de concurso público?

Ou seja, a medida chancelada pelo STF, é um tiro no pé pois, certamente levará a figura do devedor a viver na clandestinidade e criando ainda mais conflitos jurídicos que sede incidental e recursal, trazendo ainda mais morosidade à máquina judiciária.

Para se ter noção da aberração dessa decisão, imagine um devedor que passe num concurso público. Certamente, tendo um salário de servidor público, teria melhores condições de negociar ou até mesmo quitar sua dívida.

Ou ainda, uma pessoa que deve ao banco, ter sua CNH suspensa ou cassada. Porque lhe retirar essa possibilidade de transporte? De repente, não pode o devedor utilizar de veículo, como por exemplo: um veículo alugado ou de parente para levar um filho à escola e se locomover em seguida ao trabalho; tirar umas férias com a família com um carro alugado.

Essas situações no meu modo de ver, não foram cogitadas na decisão do STF. Esse entendimento só piora a situação do indivíduo devedor.

Nessas situações, se interpretarmos o inciso IV, do Artigo 139, dessa forma equivocada, basicamente toda atividade, seja funcional ou de laser que um devedor poderia fazer, em tese poderia lhe ser ceifada, já que, “se não tem dinheiro para pagar a dívida, não pode andar de veículo, conhecer outro país ou levando ao pé da letra essa interpretação do STF, se não tem dinheiro para pagar a dívida não pode ir ao cinema, teatro, etc”.

Dessa forma, entendo que a interpretação do artigo 139, inciso IV, do CPC, é equivocada e não dá ao magistrado força para essas medidas coercitivas aqui destacadas. No meu ponto de vista, o inciso IV, dá ao magistrado ferramenta para exigir que o devedor cumpra determinações que lhe foram impostas, como por exemplo: entregar um veículo penhorado. Se não entrega, juiz concede a busca e apreensão ou reintegração de posse se o caso. Aplica multa em caso de descumprimento de ordem de apresentação de objeto ou coisa, mas nunca permitir o magistrado privar o devedor de um mínimo de dignidade.



Paulo Yorio Yamaguchi OAB/SP 300.504

[1] Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: IV - determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária;

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